5 de julho de 2011

"Lonelitude"

Sinto como se ninguém se lembrasse da minha existência. Isso me machuca um pouco, mas acho que já acostumei um pouco com essa dor. A estranha sensação de andar na multidão e parecer invisível perante todos é meio perturbadora, e não entendo direito o que fiz pra sentir-me assim. O sentimento de ninguém se importar comigo, sentir minha falta ou ter um pequeno afeto por mim é doloroso, mas acostumei também. Ou ainda essa solidão ambígua, que ao mesmo tempo em que me reconforta me dá ânsia, ao mesmo tempo em que me liberta me sufoca. Esta vontade de arriscar em algo diferente, mas que a imaginação e a impaciência não permitem concretizar, ou simplesmente não saber interpretar os fatos, ou, ainda, apenas não desejar interpretá-los. Aquela falta de vontade de viver, que habita cada parte do meu ser, corrói e machuca, e cresce imensamente sem razão aparente; parece que a alimento pois a sinto pesando em meu estômago, como algo indigesto; parece que só penso nisso, pois a sinto latejando em minha cabeça a cada minuto da noite, num vai-e-vem calmo e persistente e que ecoa e me irrita.
A rotina cansativa e desprezível, em que cada dia segue monótono, uniforme: apenas um dia após o outro. Isso suga minha joy d'vivre, esmigalha o apreço que tenho por mim mesmo, sinto-me um nada, insignificante perante aos outros e à mim. Não aproveito minha própria vida, obviamente única: não amo, não tenho sentimentos, ninguém significa um pouco mais do que um simples alguém, não corro, não me cuido, não tenho autoestima, não sou útil a ninguém, não amo. Minha impaciência e meu sarcasmo já natural apoderam-se de meus sonhos e chupam-lhe a essência. Deixam-me com esta realidade que repudio por mostrar-me quem sou: uma pessoa mesquinha e asquerosa, desprovida de encantos e qualquer espécie de charme. Preciso entender.
Conduzo-me para o meu interior e vejo apenas escuridão, como numa caverna onde não é possível enxergar sua própria mão em frente do seu rosto. Estranhamente, uma inexplicável luz iluminava algumas partes dessa úmida caverna. Vejo mágoas depositadas em um canto, o acúmulo de anos me mostra uma pilha imensa, maior do que eu jamais imaginaria. Vejo que as guardo desde a mais tenra idade, algo que deveria me incomodar: mas por ser a pessoa que sou, sinto uma espécie de orgulho por ter tal capacidade, jamais esquecendo quem um dia me magoou d'alguma forma. Um pouco mais a frente, observo vários murais, em cada um pendurado milhares de pequenas notas e, em cima, li rancores. Meu ego inflou-se, vendo tantos murais com tantos rancores guardados, sorri de alegria com minha aptidão, para mim, impressionante. Continuo andando, não enxergo um enorme barranco e caio nele.
Acordo suado, assustado. Resolvo terminar com o que comecei. Pego, novamente, todas as pílulas que roubei discretamente da farmácia em que trabalho. Nunca irei mudar, sempre terei essa espécie de asco de mim mesmo, não posso viver a esmo. Dirijo-me à cozinha, encho um copo com água. Não agrado aos outros, nem a mim, não dá pra viver assim. Volto ao quarto, sento-me na cama. Ainda se alguém sentisse minha falta, mas sou, de fato, um bosta. Com o punhado de comprimidos numa mão e o copo com água na outra, penso mais um pouco: hesito. Hesito por quê, se não tenho mais ânimo pra viver? Não, não. Viro os comprimidos, e em seguida a água. Deito na cama e rapidamente adormeço.
Adormeço com o sono mais leve que tive nos últimos anos: todo o ódio que habitava dentro de mim, deu lugar a uma paz imensa, um imenso deserto onde senti a suave e refrescante brisa noturna. Alegrei-me - outro fato raro! - pensando que viverei, na morte, assim pela eternidade, e esse pensamento me deu ânimo de viver, morto enfim.
_

escrito em 2 de dezembro de 2009.

Um comentário: