5 de julho de 2011

Gusto

Estou me cortando pela décima e terceira vez. É quase um ritual: nos momentos de stress ou que necessito de um pouco de prazer, ou em ambos, corto-me. Não consigo compreender o porquê do susto das pessoas quando lhes conto. Descrevo, então, minha derradeira experiência.
Você consegue me definir liberdade? A liberdade, para mim, é cortar-me. O prazer, para mim, é cortar-me. O alívio, para mim, é cortar-me. Quando tenho raiva ou estou sob grande stress, eu me corto. Meus problemas desaparecem, minha dor é prazer e meu sangue flui, livre, em correnteza. Minha cabeça acalma, meus músculos relaxam. Eu suo, excitada. O suor salgado mistura-se com o sangue quente: isso é um perfume divino para mim. Fico tonta em delírio ao perceber que eu exalo aquele perfume selvagem; eu naquele momento sou deusa, eu ali sou cadela, eu ali sou puta, mas sou a minha puta, eu ali me desejo: e me possuo. Meus músculos, agora, retesam, contorço-me loucamente na minha dança insana, masturbo-me numa ânsia bestial, chuto a garrafa de vinho, jogo-me nos cacos. Vinho tinto, sangue e suor: gozo. Uivo como loba no cio, grito meu tesão, aperto a lâmina com força, dilacero meu braço, o sangue quente jorra: gozo. Percebo que estou sangrando demais, excito-me: chupo, engulo, saboreio, delicioso, até a última gota. Nessa louca foda-suicida, percebo que estou empalidecendo, perdendo minhas forças. Súbita sede: lambo o vinho com sangue do chão: não faz muita diferença. Sinto que são meus últimos momentos, retiro então forças do meu desejo absoluto, esforço-me para o orgasmo final: e o consigo. Deitada sobre os cacos, ofegante e molhada (de sangue, suor, vinho e tesão), exaurida e completamente fodida, estampo o sorriso mais lindo que jamais dei, enquanto meus olhos fecham-se vagarosamente.
Vou-me lentamente, o que é ótimo, pois aproveito meus minutos derradeiros relembrando tudo que fiz nessa hora que passou. A hora que valeu minha vida. A hora que me fiz feliz. Vou-me com sorriso terno em meu rosto, sorriso de criança que ganhou o que quis. Chamar-me-ão de vagabunda louca, de puta desvairada, de rampeira maluca, ao me verem nua deitada (numa poça de sangue, vinho e tesão) com a mão esquerda em minha genitália encharcada e a direita na lâmina suja. Não entenderão a minha felicidade, não compreenderão que esse foi o momento de maior alegria em minha vida. Não enxergarão o prazer dos meus atos, nem a sanidade com que os cometi. Não verão a certeza com que os fiz, nem saberão que foi exatamente isso o que quis. Tentarão, em vão, procurar razões, explicações com lógica desconexa. Revirarão meu passado, verão na minha infância se fui abusada ou algo assim, então na minha adolescência, se tive algum distúrbio ou coisa do gênero. Sorrio, desmaiada, imaginando eles mexendo em minhas coisas, tentando achar alguma carta, nota, bilhete, algo que justifique meu ato de, segundo eles dirão, loucura ou de suícida alucinada. Buscarão por alguma droga,que possa ter-me transtornado mentalmente. Rio da ignorância deles, da estupidez em não verem o óbvio.
Eu só quis prazer, liberdade e alivio. Eu só quis foder, porra.
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escrito em 15 de novembro de 2009.

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