17 de setembro de 2011

Disorder: Parte II

Tonight you just close your eyes
and I just watch you
slip away.
How close am I to losing you?
The National
 

Chamo-me Marina. Tive um namorado. Apenas um. Não quero mais nenhum, não consigo suportar a idéia doutro homem em minha vida. E não, não é por ele ter sido único, aliás, ele foi único. Mas ao mesmo tempo foi maravilhoso e destrutivo: não sei se algum dia eu me recuperarei dele. Ou ele de mim.
Tínhamos um relacionamento perfeito, ele era doce e carinhoso e tinha uma espécie de tensão vindo dele sempre, o que de alguma forma o deixava atraente. Eu era um tanto mimada e chata, vivia fazendo cara feia caso ele me contrariasse de algum jeito: na verdade, ele não precisava me contrariar, eu tinha uma estranha necessidade em fazê-lo sentir-se culpado sem haver culpa alguma. Eu sabia que ele faria tudo por mim, qualquer coisa para me agradar e eu abusava disso, com a culpa ele ficava ainda mais carinhoso e atencioso e eu demandava muita atenção. Eu fui má, ninguém entendia como ele me aguentava e hoje em dia nem eu entendo, mas entendo um pouco as reações dele depois d’algum tempo nessa situação.
Sabe, sempre bastou eu fazer uma cara de choro e ele fazia o que eu pedia (Deus, como me arrependo de ter agido assim). Aquele dia ele não fez o que eu pedi. Eu vi algo diferente nos seus olhos. Havia um brilho anormal, algo... bestial. Ele apenas tombou a cabeça um pouco para o lado, como se para me observar melhor, e então virou as costas e foi embora. Eu fiquei sem reação, aquilo nunca havia acontecido. E a partir daí só piorou: fomos numa festa, ele bebeu demais e ficou com outra menina, na minha frente. Em seguida, olhou para mim e sorriu, ele tinha aquele olhar novamente. Ele começou a me tratar como lixo: ignorava-me, não fazia mais nada que eu pedia, não comprava mais presentes, olhava-me com desprezo. Eu me sentia horrível. Isso se arrastou por uns três meses, ele enchendo a cara em bares e ficando com outras meninas, saindo a noite fazendo pequenos furtos com uns amigos delinqüentes que ele havia feito no colégio. Ouvi dizer que ele estava usando drogas e vendendo pra uns caras na escola e comprando e usando e coisas assim. Um dia ele veio me pedir dinheiro, quando já mal nos víamos mesmo sendo namorados. Aquilo foi a gota pra mim: disse no ato que não queria mais nada com ele, que não emprestaria nada a ele, cuspi na sua face. Ele tombou a cabeça pro lado, como se para me olhar melhor, e limpou o cuspe. Eu ajoelhei e chorei, eu não sabia direito o que estava acontecendo, nem sabia por que estava com uma dor insuportável no meu peito, como se o tivessem rasgando para alcançar meu coração para retirá-lo batendo ainda. Ele ajoelhou do meu lado e me abraçou: eu vi de relance seus olhos e vi seus olhos, aqueles daquele menino por quem me apaixonei, os olhos serenos que estavam sempre prontos para me acolher quando eu entrava em alguma crise feminina sem explicação. Eu me acalmei, e perguntei-lhe porque estava me tratando assim, sendo que eu nunca tinha feito nada para merecer aquilo (sim, naquela época eu não tinha me tocado que merecia grande parte do que recebia). Olhei diretamente para seu rosto quando perguntei e subitamente aquele estranho brilho estava lá. Ele sorriu e disse que precisava viver, que não queria mais nada do que tinha e almejava o tudo, queria chegar a um ápice de êxtase de sentido na vida que sua vida atual não lhe permitia. Ele queria viver. Eu olhei para ele com olhos incrédulos, já chorosa novamente, sem entender lhufas do que ele me falava. Ele beijou-me na face e disse-me com a voz doce com a qual eu era acostumada e tanto havia amado: “até algum dia”.
No dia seguinte seus pais vieram falar comigo, eles estavam em pânico pois ele havia desaparecido na noite levando suas roupas e todo o dinheiro e jóias que havia na casa. Aos prantos eles me disseram que não havia sido o primeiro roubo dele dentro do próprio lar, mas nunca tinha acontecido um daquele nível. Eles só queriam seu filho de novo, seu garoto com olhos glaucos e serenos, de voz mansa e fraseado lento, cativante com sua inteligência e boa aparência. Nunca vi pessoas tão devastadas. Ele nunca mais voltou.
Eu acostumei-me com a dor no meu peito, um soco contínuo no coração que espalhava uma curiosa angústia pelo meu corpo que me dava calafrios. Na verdade, eu gostaria de ter mais uma chance com ele, eu faria tudo diferente, eu o trataria como ele realmente merecia, com respeito e carinho, sem chantagens e joguinhos de menina mimada e imatura: eu sou outra agora. Sabe... Eu queria sentir seus lábios nos meus novamente.
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Escrito em 7 de junho de 2010.

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