17 de setembro de 2011

Disorder: Parte I

I've been waiting for a guide to come and take me by the hand 
Could these sensations make me feel the pleasures of a normal man? 
These sensations barely interest me for another day 
I've got the spirit, lose the feeling, take the shock away 
- Joy Division

Lembro levemente da minha infância: fui primeiro filho, mimado, sempre tive tudo que quis e tinha uma casa enorme, minha mãe era a mulher mais linda que já vi, com seu rosto sempre numa expressão dramática – que lhe dava um ar de atriz de cinema – carregada e isso era seu charme, como meu pai dizia; já ele era um homem sisudo, sério, todos que o viam o temiam de certa forma por sua fisionomia fechada: mal sabiam eles que ele era um dos homens mais doces que existiu, mimando-me de todas as formas possíveis e imagináveis e quando ele me via ao chegar em casa sua expressão mudava da seriedade para um lindo sorriso que alegrava até a parte mais obscura da minha alma, que eu viria a descobrir anos mais tarde, já na adolescência.


Eu olho para mim agora e sinto um misto de nojo e desprezo, nojo da minha aparência de morador de rua, mendigo batedor de carteira que precisa espancar e, já foi necessário infelizmente eu não quis mas ele me obrigou, matar para conseguir míseros trocados para comprar aquelas malditas pedrinhas que meu corpo clama como pede por água, que minha alma anseia como libertação deste corpo desgraçado que ela habita infelizmente contra vontade já que a possuo e insisto em continuar vivendo para o azar dela, assim não deixando-a livre para que possa assim viver e é até estranho falar assim, mas eu realmente não sei porque continuo a viver, digo meu corpo pois minha alma espanca-me por dentro por liberdade. E desprezo – como não senti-lo sendo o que sou no estado que estou – de me encontrar assim largado como peça dispensável como algo estragado como amor inviável (e como dói, esse maldito) como... nada, é sim, eu sou um nada, aquela nada que habita as ruas e caso não resmungasse você passaria por cima sem problemas um nada que preenche as lacunas dessa cidade imunda – graças a tipos como eu, ou seria mim? – e lota os becos escuros, minha sala cozinha banheiro quarto, que não há ser racional nesse mundo que ouse a se aproximar.
Mas então teve minha adolescência e ter tudo na mão soava entediante e eu necessitava de desafios para ter motivos a viver pois do jeito que tava o que eu menos tinha era vontade de viver: e olhe que eu era jovem e já tinha essa cabeça meio depressiva-lunática: já comentei que sempre tive problemas para me expressar porque regurgitava as palavras sem ao menos me dar ao trabalho de pensá-las o que ocasionou alguns socos e tapas na caras várias amizades perdidas e algumas muitas meninas a menos em minha vida (cama)? Por falar em meninas, amo-as. Melhor: amava-as. Não sei o que é sexo há vários anos e o amor no seu sentido mais puro (não aquele carnal porco [aliás esse nem amor é é apenas desejo-instinto como cão no cio almeja uma cadela para satisfazer-se] esse sempre foi presente e ainda o é pena não poder acalmá-lo) pelo sexo oposto sempre foi inexistente em minha vida, e eu não quis dizer que sou gay e pra não dizer que minto, tive sim experiência de amor na sua forma mais pura, mas acabou não dando certo e deixando crateras pela minha alma que ainda relembra cada tiro nela dado – essa dita é rancorosa demais e insistentemente cada noite que vou dormir faz questão de passar sua delicada mão suavemente por cada ferida relembrando-me de cada dor que eu a fiz sentir – ... Ah, Marina.
Então minha necessidade em aproveitar a vida levou-me a necessidade de arriscá-la, pois em minha cabeça viver a vida significa levá-la ao limite do bom-senso (inexistente nessa época) para tristeza dos meus pais que sempre me catavam no jardim de casa, isso quando eu dava sorte de cair nele e eles não tinham que me procurar pelos bueiros podres das ruas deterioradas, em que eu caia bêbado num estado que nem sei como tenho meu fígado hoje em dia. Arrisquei-a ao máximo que meu vicio, minhas dependências químicas fizeram de mim ladrão e assassino e quando objetos de casa começaram a sumir meus pais não viram outra alternativa a não ser expulsar-me de casa, afinal já tinha sido três internações e obviamente nenhuma delas com sucesso; hoje em dia já lembro mais do rosto deles, mas ainda sinto uma falta desgraçada deles e se tivesse capacidade e força de vontade de refazer de mim pessoa eu gostaria de vê-los novamente.
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Escrito em 23 de maio de 2010. 

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