26 de fevereiro de 2013

O despertar

Despertou com uma voz que sussurrava baixinho, com delicadeza e ternura, seu nome de forma carinhosa. Abriu os olhos vagarosamente, e observou o rosto que estava ao seu lado: um par de lindos olhos castanhos lhe sorriam, enquanto aconchegantes lábios desenhados murmuravam sons que lembravam um pequeno gato: ronronava com uma sutileza felina que lhe encantara por completo. Só lhe restou sorrir e abraçar aqueles lábios com os seus.
Na noite anterior, o Blues rasgara suas almas, e as unira sob o som de "I'm your hoochie coochie man" duma forma onírica: os cinco sentidos se aqueceram e, no mesmo instante que a guitarra chorava, lábios foram dedilhados; conforme o ritmo aumentava, a respiração acelerava. As pontas dos dedos se entrelaçavam nos cabelos e os acarinhavam com desejo e curiosidade. Fez-se a magia da reciprocidade.
Quando deitaram, o par de olhos sorridentes eram pura poesia: bichinhos dengosos que se aninharam em braços abertos, prontos para acolhe-los e protege-los das mazelas do mundo; prontos para entrete-los e distraí-los das mazelas do mundo; prontos para abraça-los e não mais soltá-los: um par de bichinhos que encantara o outro par de olhos. Se antes apagados e desacreditados, agora tinham um brilho particular: recuperara a fé.
Sentia agora, nos lábios, uma doçura que não lembrava que existia.

25 de fevereiro de 2013

Vira lata

A gente é cachorro vira lata
daqueles moribundo,
bem vagabundo,
maltratado pela vida:
vida desvalida.

A gente é cachorro vira lata
daqueles que têm focinho esfregado
no chão,
e no dia seguinte, desamparado,
lambe aquela mesma mão.

A gente é cachorro vira lata
daqueles que leva bicuda
e sai chiando,
e quando dona grita "acuda"
desbarranca atrás matando.

A gente é cachorro vira lata
daqueles que é expulso sem medo
e fica perdido sem rumo,
mas quando dona estalar os dedos,
vida volta ao prumo.

A gente é cachorro vira lata
daqueles cheio de lealdade,
que tá com a sina escrita e não aprende
que na primeira oportunidade
tua dona te vende.

19 de fevereiro de 2013

Um aceno

Eu irei correr até o rio.
Levarei comigo um buquê
de flores roxas e azuis,
e junto com elas uma caixa de lembranças.

Nesta caixa há um oceano,
um oceano em tempestade,
uma tempestade perenal
que inundou minha vida.

Deslizarei suavemente pela margem,
acompanhando com olhos curiosos
o desenho que teus pés ociosos
fazem, enquanto teus lábios, desenhos,
sussurram Neruda.

E quando eu estiver no rio,
eu irei sorrir.
Eu irei sorrir, e pétala por pétala,
abrirei minh'alma, e assim a deixarei;
para que a correnteza a lave e leve.

E quando eu voltar do rio,
eu irei sorrir.
Eu irei sorrir, e retalho por retalho,
costurarei minh'alma, e assim a vestirei;
para que a caixa fique no rio que a deixei.

18 de fevereiro de 2013

o Equilibrista

Procuro o Equilibrista.
Um que não seja egoísta,
e compartilhe comigo
a magia que há no abrigo
de estacar os pés no chão
da corda: firme sensação.

Procuro o Equilibrista,
para que ele me ensine a arte
do equilíbrio:
qual o ponto do balanço
perfeito,
para que eu não penda
para a
tristeza ou
para a
incerteza?

Procuro o Equilibrista.
Um de sangue e calor,
paciente e escritor:
de sorriso belo e que não desista.
Um de lábios desenhados e
voz doce.

Procuro o Equilibrista,
para que ele me ensine a arte
de versar:
qual o ponto do verso
perfeito,
para que ele não penda
nem para a
dor
nem para o
amor?

Procuro o Equilibrista,
para que ao me equilibrar,
ele me desequilibre.

17 de fevereiro de 2013

Tenho fome

Estou com fome.
Fome de sorrisos:
basta um e eu eternizo.

Estou com fome.
Fome de amor:
um puro, por favor.

Estou com fome.
Fome de paz:
uma bandeira branca me satisfaz.

Estou com fome.
Fome de vida:
ao máximo, nada comedida.

Estou com fome.
Fome de sentir.
Coração, pare de rugir.

5 de fevereiro de 2013

Sombras

Quando a grana tá curta,
a amizade surta.
Mas quando a conta eu acerto,
não falta gente por perto.

Meus amigos
só aparecem quando eu bebo.

Quando meu copo tá vazio,
eu sinto frio.
Mas quando meu copo está cheio,
eu tenho o calor alheio.

Meus amigos
só aparecem quando eu bebo.

Quando eu tenho fome,
não lembram o meu nome.
Mas quando eu tenho cerveja,
o pessoal até festeja.

Meus amigos
só aparecem quando eu bebo.

Inspirado por Vanguart e pessoas.